jul/19 | em Depoimentos

Depoimento FLTA: Priscila Bordon

Em 2014, a vida de Priscila Bordon mudou. A professora de inglês de uma escola pública de Pindamonhangaba, em São Paulo, formada em Letras em uma universidade local, resolveu correr atrás do sonho de estudar no Exterior e se candidatou para o programa FLTA (Foreign Language Teaching Assistant). Priscila foi selecionada para a turma de 2015-2016 de bolsistas da Fulbright e, sem nunca ter tido experiência prévia no Exterior, embarcou para dar aulas de português na  Bennett College, na Carolina do Norte, com bolsa Fulbright. Confira abaixo a entrevista com a bolsista:

Fulbright – Como você ficou sabendo do programa FLTA e o que motivou você a se inscrever?

Priscila Bordon – Em 2012, eu me efetivei como professora da rede estadual de São Paulo e pra mim aquele era o ápice da minha carreira como professora. Até então apenas sonhava em viajar para o exterior nas férias, e nem se quer imaginava que conseguiria estudar ou trabalhar fora. Em 2013, recebi da minha diretoria um edital da Fulbright para o programa de desenvolvimento profissional de professores de escola pública, o famoso PDPI, mas como havia me efetivado a apenas um ano e não tinha completado meu estágio probatório, o sonho se quer durou um dia. Mas sou curiosa e algo me dizia para não desistir. Entrei no site da Fulbright pra conhecer melhor o que era e se havia alguma outra oportunidade pra mim, foi quando encontrei o edital para o FLTA. Estava motivada a dar aulas em uma universidade nos EUA, o que seria uma experiência riquíssima, além de ter a oportunidade de ter aulas de matérias que sempre fui apaixonada como literatura americana era algo que me parecia surreal.

Minha maior motivação era mostrar para meus alunos, que vivem no mesmo bairro que eu, que alguém do convívio deles conseguiu realizar um sonho

Minha maior motivação era mostrar para meus alunos, que vivem no mesmo bairro que eu, que alguém do convívio deles conseguiu realizar um sonho. Foi difícil superar o “Eu, professora de escola pública de Pindamonhangaba formada numa faculdade local não vou ser capaz de passar por um processo seletivo desses”. E por alguns meses desisti da ideia. Maio de 2014 e a vontade de tentar não ia embora, então decidi que tentaria. E cada etapa do processo foi uma vitória. Passar o TOEFL, escrever meus primeiros textos acadêmicos em inglês, fazer minha primeira entrevista inteiramente em inglês. Todo o processo já tinha valido a pena por eu ter conseguido acreditar em mim. Aquele momento mudou a minha vida. A Fulbright definitivamente mudou a minha vida desde o processo seletivo até hoje.

Fulbright – O que foi o mais interessante da experiência como FLTA para você?

Priscila – Eu escolhi (e fui escolhida) para ir para uma HBCU (historically black college/university), a Bennett College em Greensboro, Carolina do Norte. Além de ser uma HBCU, ela é uma faculdade apenas para mulheres. Uma experiência que me tornou mais consciente da história da luta negra nos EUA. Muitas professoras, que eram maioria na Bennett, haviam lutado pelos direitos civis em Greensboro, conhecida pelo sit-ins nos anos 60. Dei aulas de português para três alunas que estava se formando em Africana Women Studies. Fizemos um projeto juntas sobre Beyoncé e a polêmica do video de ‘Formation’ onde elas explicavam para brasileiros por que o vídeo e a música estavam no ‘spotlight’. Elas me ajudaram a criar as legendas em português para o vídeo. A experiência de conviver com essas mulheres me tornou também uma mulher mais forte para lutar contra injustiças como professora de escola pública, para defender o direito dos meus alunos de se libertarem através de uma educação para ajuda-los a se empoderar, e não os treinar. O papel das universidade negras nos EUA foi crucial na luta pelos direitos civis, e eu sai de Greensboro decidida a fazer da educação uma força de mudança na vida dos meus alunos e alunas.

Fulbright – Que tipo de atividade você desenvolveu nos Estados Unidos como FLTA?

Priscila – Eu tinha duas turmas, uma para alunas da faculdade, e outra para membros da comunidade. Tinha poucos alunos pois a universidade era pequena, tinha em torno de 500 alunas. A faculdade não tinha em departamento de português. Eu era primary instructor, então todas as decisões em relação as aulas eram feitas por mim. Decidi pelo livro didático, syllabus e eu decidia também como avaliar minhas alunas. Foi uma experiência que me fez desenvolver uma lado autônomo que nunca tinha experimentado antes. Além dessas duas turmas, também fazia aulas. Fiz quatro cursos com créditos; literatura americana, escrita acadêmica, literatura inglesa medieval e gramática avançada. Fazer parte de uma vida acadêmica ativamente dentro de uma universidade me fez aprender a amar escrever academicamente. Nunca tinha tido a chance de escrever essays e artigos em inglês.

Como FLTA também era representante do Brasil tanto na minha universidade como na comunidade universitária de Greensboro, que tem quatro universidades. Nenhuma universidade da cidade oferecia curso de português então muitas pessoas dessas outras universidades me procuravam para praticar português e para apresentar o Brasil em eventos. Organizei o primeiro ‘cultural festival’ da universidade com ajuda dos outros FLTAs para ajudar a divulgar as línguas estrangeiras que a universidade oferece.

Como você acha que essa experiência influenciou seu trabalho e sua carreira?

Priscila – A experiência de ser FLTA mudou meu entendimento do que significa ensinar uma língua, seja ela qual for. Aprender português para minhas alunas não tinha valor comercial, não era para se tornarem competitivas no mercado de trabalho, elas faziam isso por que se identificam com a história do Brasil e como a história do Brasil e dos EUA se entrelaçam. Para elas, conhecer a língua tinha relação com a cultura e a história, e com a própria identidade delas. Levei esse aprendizado para a escola pública e estudei mais como poderia fazer o mesmo em relação ao ensino da língua inglesa por uma perspectiva que valorizasse a identidade e a história dos meus alunos o que me fez ir para Southampton, no Reino Unido, estudar Global Englishes.

Fulbright – Qual a recomendação que você daria para os futuros candidatos?

Priscila – Se candidatem. Não percam a chance de terem suas vidas mudadas para sempre. Muitas oportunidades irão surgir durante sua vida como Fulbrighter de entender o que é ser um(a) representante do seu país e conviver com pessoas que vão te inspirar a ser, como diria Gandhi, a mudança que você quer ser no mundo. Ser Fulbrighter é ser uma força de transformação por onde você for.

As inscrições para o programa FLTA 2020-2021 estão abertas até 28 de julho. Confira o edital e finalize sua candidatura


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